Visão Geral
Algum tempo atrás eu assinei um certo sistema de assinatura de livros e a Praça dos Diamantes foi um dos livros enviados. Este livro foi da edição de Dezembro 2017, na época lembro que comecei a leitura, mas abandonei. Por quê? Logo que comecei percebi que eu nunca compraria esse livro (👀 juro que sou uma pessoa legal). Costumo a gostar de tramas intrincadas, com reviravoltas e desastres inesperados e nenhum desses items descreve a história desse livro, tanto que assim que ele chegou comecei a leitura mas abandonei.
A história é bem crua, e não no sentido the mal escrita ou feita as pressas, crua no sentido de real. Não existem voltas para passar o tempo, ou missões desnecessárias que servem de maquiagem para a falta de profundidade da trama.
Esse livro se passa na Barcelona da década de 30 e conta a história de Colometa (Natalia) e todos os seus dramas domésticos até a explosão da guerra civil. Logo de início criei para mim a visão da personagem principal como (aqui vai uma das minhas anotações do dia em que eu li os dois primeiros capítulos) inocente, influenciável, tímida e de pouca personalidade.
A história é narrada em primeira pessoa e é marcada pela oralidade. Por muitas vezes somos levados pelo fluxo de pensamento da personagem para temas periféricos a trama principal, dessa forma temos não só um relato factual, mas também uma visão de como a personagem se sente, seu passado e o contexto das situações. Através dessa narrativa é possível ver a inocência da personagem em todas a desavenças que a mesma passa. Fiquei em vários momentos exasperada com as coisas que lhe acontecem, ao mesmo tempo que ela (Colometa) mantém o mesmo olhar inocente sobre o mundo.
A narrativa de Colometa é marcada por seguir o fluxo de consciência, repleta de fragmentações temporais, o que revela momentos de confusão e até alucinações. É um livro cheio de simbolismos, grande parte de ponto de vista doméstico enquanto aborda a guerra civil espanhola a partir do ponto de vista de Colometa.
Confesso novamente que nunca compraria esse livro, principalemte pela trama simples, excesso de simbolismos – sempre peco em reconhece-los, frequentemente tomo tudo em seu sentido literal – e a ótica doméstica. No entanto, a habilidade de autora de navegar pelas situações é primorosa, a leitura é fácil e fluida, deixo aqui o comentário de um crítico: “Não é fácil chegar ao resultado obtido por Rodoreda quando se tem um só foco narrativo”.
Por fim, fico feliz de ter lido esse livro, percebo ser necessário ler além do seu próprio nicho. De outra forma nunca conheceria a obra da habilidosa Mercè Rodoreda. E no final, um trama não precisa de histórias intrincadas, reviravoltas e desastres inesperados para ser envolvente.
Resumo
Essa parte contém spoilers. Anoto os principais pontos da história para evitar os efeitos do tempo.
O livro começa quando Natalia é convidade para um baile na Praça do Diamante. Nesse baile ela conhece Quimet, um jovem bem-afeiçoado e impulsivo que naquela mesma noite declara que eles vão se casar e passa a chama-la de Colometa (que significa pombinha). Natalia que era noiva, termina o noivado com um jovem cozinheiro e eles, apaixonados, começam os preparativos para o casamento.
Antes mesmo do casamento Quimet se mostra manipulador e ciumento, selecionei algumas passagens para dar vida ao meu lamento:
– E se eu não gostar de alguma coisa de jeito nenhum?
– Tem de gostar, porque você não entende disso.
Página 21
…briguei de novo com Quimet por causa da sua implicância com o confeiteiro.
– Se eu o vir de novo olhando para o seu traseiro com aqueles olhos, vou entrar e ele vai ter que me ouvir - Ficou uns dois ou três dias sumido…
Página 32
[Veio] pedir explicações, porque me vira passeando com o Pere (ex-noivo). Disse que ele deve ter me confundido com outra. Ele falou que era eu mesma. Jurei que não era verdade, e ele jurava que era… No dia seguinte, voltou e disse que eu tinha de lhe prometer que não iria mais sair com o Pere e, para acabar com aquilo de vez e não ter de ouvir mais a sua voz, pois qunado ele ficava furioso não parecia a dele, eu disse que iria fazer o que ele queria… Ficou que nem um capeta, falou que estava farto de metiras, que me havia preparado uma armadilha e eu tinha caído que nem um ratinho, me fez pedir desculpas por ter ido passear com o Pere e por ter lhe dito que não havia saído e, no fim, me fez chegar a acreditar que eu havia saído e disse que me ajoelhasse.
Página 32 e 33
As artimanhas de Quimet são diversas e vão desde a mencionar uma certa Maria (que ele diz dispensou por Colometa), até uma certa dor na perna que só aparece a noite, artimanhas que são notadas, mas desconsideradas por Colometa. Eles se casam, reformam uma casa e logo vem os filhos, primeiro um menino e depois uma menina.
A história segue e Quimet decide que seu mais novo projeto será construir um pombal, de início as coisas saem como o planejado, mas em certo ponto ele começa a ficar obsecado pelos pombos. Na cabeça de Quimet os pombos seriam uma grande fonte de renda e o tornariam rico. O que faz com que ele aumente a criação de pombos e crie aposentos destinados aos pombos dentro de sua própria casa. Essa “invasão” doméstica incomoda Colometa profundamente e por muito tempo ela convive com os pombos em sua casa até que outra coisa chama atenção de Quimet: a guerra civil espanhola. O interesse de Quimet pelos pombos diminui e Colometa começa a traçar um plano para livrar-se deles. Nesse mesmo período ela começa sabotar os ovos do pombos para que não se multipliquem
Quimet decide se juntar a um grupo paramilitar e participar da guerra deixando Colometa e as crianças para trás. Com a guerra começam a faltar recursos e Colometa é obridada a procurar emprego. Quimet retorna algumas vezes com mantimentos, mas logo chega a notícia de sua morte. A guerra se extende, comida e trabalho se tornam cada vez mais escassos, para sobreviver Colometa começa a vender todos os seus pertences: roupas, cama, armários, louça, até nada restar.
Um dia ela traça um plano para dar fim a todo o sofrimento que recaiu sobre ela e os filhos: decide comprar ácido nítrico para tomar com as crianças. Ao fazer o pedido ela diz que não trouxe dinheiro na carteira e o bondoso merceeiro (um velho conhecido) diz que ela pode levar e pagar outro dia. Comolometa sai da loja decidida a por um fim em tudo quando é surpreendida pelo mesmo merceeiro que lhe oferece um serviço de arrumadeira, ela aceita e ele a manda embora com vários suprimentos. Antes de ir Colometa devolve o ácido nítrico pondo um fim em seu plano.
Colometa trabalha na casa do merceeiro por algum tempo e o emprego permite que ela e os filhos voltem a se alimentar apropriadamente. O merceeito chamado Antonio um dia a chama para conversar e diz que havia sido mutilado na guerra e por isso não teria mais chances de constituir família, ele continua dizendo ela é viúva e com filhos e que ele gostaria de casar com ela. Um seria a companhia do outro e as crianças teriam todo o apoio que precisassem. Depois de um período de reflexão Natalia aceita a proposta e eles se casam.
Depois do casamento Natalia continua apriosiondada pelas lembranças do passado, no entanto sua vida está melhor, não lhe falta comida, seus filhos são bem cuidados e desenvolvem um carinho pelo novo marido, que as trata como filhos. No último momento do livro Natalia volta a praça do diamante, onde de uma vez por todas, consegue se libertar dos fantasmas de seu passado e voltar para sua nova vida satisfeita.